sexta-feira, 16 de maio de 2008

Governadores denunciados por fraudes em licitações

Jornal do Brasil, 14/05/08

Luiz Orlando Carneiro

O ministério Púbico Federal denunciou ontem 61 envolvidos no esquema de fraudes de licitações públicas, comandado pelo empreiteiro Zuleido Veras, dono da construtora Gautama. Entre os denunciados estão o empresário, os governadores do Maranhão, Jackson Lago, e de Alagoas, Teotônio Vilela Filho, e o ex-ministro de Minas e Energia Silas Rondeau.

Os governadores do Maranhão, Jackson Lago (PDT), e de Alagoas, Teotônio Vilela Filho (PSDB), o ex-ministro de Minas e Energia Silas Rondeau, além dos ex-governadores José Reinaldo Tavares (Maranhão) e João Alves Filho (Sergipe) foram denunciados, ontem, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Eles são acusados pelo Ministério Público Federal pela prática de crimes de quadrilha, corrupção passiva, peculato e contra o sistema financeiro, com base em inquérito penal gerado pela Operação Navalha, da Polícia Federal.

No total, as subprocuradoras-gerais da República Lindôra Araújo e Célia Regina Delgado ofereceram denúncias contra 61 pessoas, envolvidas no esquema de fraudes em licitações públicas, comandado pelo empreiteiro Zuleido Veras, dono da Construtora Gautama. O empresário foi denunciado 103 vezes por crime de corrupção ativa.

Na denúncia, as procuradoras afirmam: "A análise das condutas dos investigados demonstra a existência de um sofisticado grupo criminoso, comandado pelo denunciado Zuleido Soares Veras e integrado por empregados da Construtora Gautama e por lobistas, que se aliaram de forma permanente e estável para a perpretação da prática delituosa: o direcionamento de recursos públicos federais e estaduais para obras a serem executadas pela Gautama; o vencimento de processos de licitação; e a liberação de pagamentos de obras superfaturadas, executadas irregularmente, ou mesmo inexistentes, mediante a corrupção de servidores públicos e agentes políticos".

Quatro fases: Os esquemas de desvio de dinheiro público ocorreram no Maranhão, em Alagoas, Sergipe e no Piauí e, ainda conforme a peça da denúncia, as atividades "delituosas" do grupo dividiam-se em quatro fases. Na primeira, eram identificados os ministérios onde havia recursos destinados a obras públicas nos Estados e municípios. Em seguida, "cooptavam-se agentes políticos e servidores públicos para viabilizar a realização dos convênios entre os ministérios e os entes federativos, participando, inclusive, da elaboração dos projetos técnicos e estudos".

Num segundo momento, a quadrilha atuava na fase da licitação, a fim de que a Gautama fosse a vencedora, isoladamente ou em consórcio. A terceira fase ocorria no início das obras e, ainda de acordo com a denúncia, era a mais proveitosa para o grupo criminoso, por ser o momento em que ocorriam o desvio e a apropriação dos recursos. "Nesta etapa eram apresentadas as medições periódicas, todas fraudadas, que eram aprovadas e os valores respectivos pagos, mediante a corrupção dos servidores incumbidos de examinar os processos", afirmam.

Na última fase, recebidos os pagamentos, "o grupo se incumbia de distribuir as propinas devidas, nos percentuais previamente ajustados com os servidores públicos e agentes políticos envolvidos".

No Maranhão, a Gautama e o governo estadual firmaram contrato considerado ilícito no valor de R$ 143.2 milhões, para a construção de pontes e melhoria do sistema de rodovias. O valor das obras investigadas em Alagoas, e que levaram à denúncia do governador, funcionários e da cúpula da Gautama era de R$ 77,8 milhões. Em Sergipe, o contrato tido como ilegal foi com a Companhia de Saneamento (Deso), para a execução das obras e serviços do sistema da adutora do Rio São Francisco, no valor de R$ 128,4 milhões. No Piauí, os principais crimes imputados ao ex-ministro Silas Rondeau são referentes a verbas provenientes do programa "Luz para todos", do governo federal, destinado a levar energia elétrica à população rural de todo o país. O processo corre no STJ por ser o foro especial por prerrogativa de função para julgar governadores em crimes comuns.

Reflexão: Uma das tarefas fundamental de toda as instituições publica é combater o desvio de recursos e a improbidade administrativa. Podemos pensar com certeza que a principal tarefa é a organização política administrativa ou que a fundamental é operar o desenvolvimento econômico. Tarefa inadiável, condicionante das outras, o combate à corrupção adquire caráter político didático, econômico, social e cultural.

Sabemos que não é fácil combater os desvios de recursos publico, mas é necessário inteligência, persistência, participação publica e objetivos claros. Que devem se transformar em políticas publica de forma permanente, sempre atualizada com planejamento e definição de metas.

A sociedade carece por instituições publicas transparentes, honestas e eficientes no atendimento das demandas do povo originadas pela difusão do ensino e das modernas tecnologias de informação. Constata-se que a corrupção decorre do mau funcionamento dos mecanismos de controle do Estado e da formação histórica do Estado brasileiro com seus traços marcantes de clientelismo, nepotismo e falta de ações transparentes.

Carlos Henrique da Silva / José Batista da Silva

sexta-feira, 2 de maio de 2008

TCU INVESTIGARÁ FUNDAÇÕES DE UNIVERSIDADES


Só em 2007, entidades receberam R$825 milhões de órgãos do governo federal, mas não são fiscalizadas
Jornal: O GLOBO 20/04/2008

Maria Lima e Demétrio Weber

BRASÍLIA. Criadas para atrair investimentos em ensino e pesquisa e dar mais agilidade à gestão das universidades, as fundações de apoio viraram sinônimo de descontrole do dinheiro público. Só em 2007, as 86 fundações credenciadas no Ministério da Educação (MEC) e no Ministério da Ciência e Tecnologia — todas elas sem fins lucrativos — receberam R$825,5 milhões de diferentes órgãos do governo federal, segundo levantamento da ONG Contas Abertas, com base no Portal da Transparência.

Alarmado com os indícios de mau uso dos recursos, o Tribunal de Contas da União (TCU) vai realizar auditoria nacional em todas as fundações de apoio. A investigação foi aprovada na última quarta-feira e será iniciada nas próximas semanas:

— Os desvios têm ocorrido no Brasil inteiro. As fundações passaram a ser usadas de forma muito ampla, com atribuições administrativas que não correspondem à proposta inicial de sua criação — diz o ministro do TCU Aroldo Cedraz, um dos autores do pedido de auditoria.


‘Ninguém sabe como foi gasto’
Como são entidades de direito privado, as fundações não estão sujeitas aos mecanismos de controle do setor público. Um deles é o Siafi, sistema informatizado que permite monitorar os gastos federais.

— É uma dor de cabeça para os órgãos de fiscalização. Os gastos das universidades podem ser fiscalizados através do Siafi, mas, quando elas repassam recursos para as fundações, eles somem, não deixam rastro. Ninguém sabe para onde foi e como foi gasto — diz o procurador do Ministério Público no TCU, Marinus Marsico.

O risco de fraudes é multiplicado por uma brecha legal, que dispensa licitações nos contratos entre órgãos públicos e fundações vinculadas a instituições de ensino.

Em Brasília, o Ministério Público do Distrito Federal constatou que prefeituras petistas, entre elas as de São Paulo, Recife e Nova Iguaçu, recorreram à Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec), da Universidade de Brasília (UnB), para obter assessoria de gestão nos últimos anos. A Finatec é a mesma que pagou a lixeira de R$990 e a luxuosa decoração do apartamento funcional do reitor Timothy Mulholland, que renunciou ao cargo no domingo passado.

Na condição de entidade privada, a Finatec contratou as empresas de consultoria Intercorp e Camarero&Camarero. Ou seja, o dinheiro saiu do cofre das prefeituras e foi parar em empresas privadas sem obedecer à exigência de licitação. Segundo Souza, a Finatec movimentou cerca de R$100 milhões em 2007.

O promotor acusa a Funsaúde, outra fundação de apoio da UnB, de usar recursos federais de um projeto de saúde indígena para comprar canetas Mont Blanc e pagar almoços e jantares que serviam até caviar.

O problema não é novo. Em 2004, um relatório do MP do DF já listava indícios de irregularidades na Finatec. Uma delas é a contratação da UnB pela Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero) para desenvolver sistemas de dados em aeroportos. A UnB repassou o serviço para a Finatec, que subcontratou a empresa IOS Informática. De 1995 a 1999, a IOS recebeu R$11 milhões, segundo o MP. Pior: tanto a UnB quanto a Finatec teriam cobrado taxas de administração, encarecendo o valor pago pela Infraero.

— É uma cadeia de contratações que vai deixando dinheiro no caminho e perdendo a transparência — diz o promotor de Fundações do MP do DF, Ricardo Antônio Souza.

No Rio Grande do Sul, duas fundações de apoio ligadas à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) — Fatec e Fundae — estão no centro de um escândalo que teria desviado R$44 milhões, entre 2003 e 2007. Contratadas pelo Detran gaúcho, as fundações subcontratavam empresas encarregadas de aplicar exames de habilitação de motoristas, com valores superfaturados. O caso deu origem a uma CPI na Assembléia Legislativa, que aprovou a quebra do sigilo bancário do ex-reitor da UFSM Paulo Sarkis:

— As fundações contratavam empresas que superfaturavam o serviço e legalizavam um processo de propina no Detran. Parte do dinheiro ia para dirigentes das fundações e políticos — diz o presidente da CPI, o deputado estadual Fabiano Pereira (PT).

Denúncias em Santa Catarina
Em Florianópolis, a Fundação de Ensino e Engenharia de Santa Catarina (Feesc), da Universidade Federal de Santa Catarina, ficou um ano sob intervenção judicial por irregularidades nas prestações de contas. O MP realizou auditoria e investiga agora se é o caso de propor ação penal contra ex-dirigentes.

— Existe uma gangue, uma quadrilha organizada que desvirtua o objetivo do terceiro setor. Usam uma estrutura sadia para aparelhamento político e desvio de dinheiro publico — diz o senador Heráclito Fortes (DEM-PI), autor do pedido de criação da CPI das ONGs no Senado.

O presidente do Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior (Andes), Paulo Rizzo, lembra que a entidade denuncia o mau uso das fundações há uma década:

— As fundações estão sendo utilizadas para fazer caixa dois por políticos e reitores, que fazem campanhas milionárias desviando recursos. Usam as fundações para troca de favores e compra de votos — diz Rizzo.

Reflexão: A política de fomento a pesquisa acadêmica faz com que as fundações de apoio às universidades continuem a existir, embora seja evidente que estas, constituem uma demonstração do negativo o ‘jeitinho brasileiro’. São irregulares para flexibilizar o rígido sistema burocrático presente nas universidades. Quando uma organização pública necessita de uma fundação de apoio, esta dado o sinal de que a propriedade pública impõe-lhe restrições administrativas incompatíveis com a fundamentos do serviço que ela presta.

Atuando como uma entidade do terceiro setor ou numa organização social as fundações de apoio deveriam ser transformada em uma organização pública não estatal. As universidades brasileiras não tomam as iniciativas necessárias para se auto-reformar, se modernizar para ganhar, além da autonomia acadêmica que já possui, a autonomia administrativa necessária, podendo não mais utilizar o artifício das fundações de apoio.

As fundações de apoio surgiram para auxiliarem as universidades a realizarem pesquisas e estudos solicitados por órgãos do Estados como, por exemplo, consultorias, cursos curtos de educação continuado. Como essas atividades não sejam o núcleo das atividades das universidades, que é o ensino regular de graduação, pós-graduação e a pesquisa são atividades legitimas. Por isso podem perfeitamente ser remunerados pelos beneficiários dos serviços, completando a remuneração dos docentes. Por que as universidades não promovem diretamente essas atividades, ao invés de recorrer as fundações? Porque essas atividades exigem flexibilidade e ajustamento ao mercado o que se mostra impossível na propriedade pública.

As fundações de apoio constituem uma forma ‘astuta’ brasileira, de complementar o salário dos docentes de departamentos profissionais estimulando-os a permanecerem na instituição em vez de se dedicarem à consultoria privada.

Do ponto de vista da burocracia do Estado as fundações de apoio são irregulares, é uma forma de fugir aos contratos rígidos que a máquina Estatal impõe à suas atividades. Do ponto de vista amplo, trazem o risco de não serem transparentes e de se furtarem ao controle necessário da sociedade.

Carlos Henrique da Silva

José Batista da Silva